Meu filho Victor e eu. |
Que
cara maluco! Não sabe nada a meu respeito, quem eu sou, o que faço e se tenho
condições de estar no meio de uma tarde, quanto mais uma 2ª. feira e com roupa
de corrida !?!
Lembro-me
muito bem que no almoço em casa quando todos me viram de tênis, calção e
camiseta acharam que eu estava delirando. Parei tudo o que estava fazendo para
ir conversar com um cara que não conhecia, mas que poderia me preparar para uma
maratona.
Feito
as apresentações, ele fala: “ Você passou no teste”. “ Muitos me falam
que querem correr uma maratona, mas não tem idéia do que isso representa.
Marcar esse horário foi um teste para verificar o seu real interesse. Se não
houver sacrifício, dedicação, impossível correr uma maratona”. “Vou
prepará-lo!” (5 meses para a prova).
Com
a corrida, novos hábitos alimentares. Um ex sedentário acabara de nascer.
·
menos
10 quilos de gordura,
·
mais
3,5 de massa magra,
·
freqüência
cardíaca máxima saltou de 169 para 199.
Passei
a correr provas menores na companhia do meu filho, que se entusiasmou
tanto que decidiu correr a maratona comigo. Quer honra maior para um pai?
Sua namorada, animada, se inscreveu nos 10k, prova simultânea a maratona
de Santiago. Não parou por aí. Minhas duas filhas, passaram a correr também,
levando com elas o marido e o namorado e para fechar o time da família de
corredores, minha princesa Néia, minha grande companheira a 29 anos, faz a sua
inscrição nos 10k. Muitos me perguntam por que a chamo de princesa e não de
rainha? A resposta é simples. Vocês já viram alguma princesa velha? Ela
será eternamente a minha princesa.
A
família, já está se preparando para o final do ano. Iremos correr todos juntos.
Que maravilha! Obrigado meu Deus!
Eu
só falava em treinos, quilômetros rodados, tênis, dieta, etc. Minha princesa me
pedia para me conter, pois poderia estar incomodando as pessoas com aquele
papo. Comecei associar a gestão empresarial, suas melhores praticas à praticas
da corrida. Minha estratégia para correr a maratona foram alicerçadas em
3 pilares: Resistência, Equilíbrio e Velocidade. Em todas as reuniões
com clientes, fornecedores, advogados, estava eu falando da alimentação
saudável, pratica de exercícios, objetivos e metas. Recebi até um convite para
uma palestra a um grupo de empresários e executivos em SP para falar sobre o
tema.
Voltando
aos treinos.
Dezembro:
Estava
indo tudo perfeitamente bem. Meus primeiros 15k completados na São
Silvestre na companhia dos amigos João Envagelista e Rogério Resch. Amigos
especiais, que me motivaram e inspiraram a pratica da corrida. Sou muito grato
a eles.
Janeiro:
21k,
minha Meia Maratona.
Fevereiro:
Me
consolido nos 25k. Sair de casa só se for para correr 10k, menos
não compensa! Era o jargão em casa.
Março:
Minha
ansiedade em ultrapassar os 30K estava muito alta, por que, logo após, o
longo subiria para 36k. Completei os 30 com muita tranqüilidade
com o tempo de 3:20 horas, projetando o tempo para os 42k, 4h40' no
máximo.
Chega
o dia dos 36k. Esse treino é importante por que significa que você
estará pronto para os 42. “ Você já viu alguém bater recorde nos treinos?”
“O seu melhor será no dia da prova”. Rodrigo Murakami.
O
planejamento de um treino longo é muito importante. Seu resultado depende
da logística, alimentação e hidratação, caso o contrário, somente se o Murakami
estiver fazendo o apoio, levando água e gatorede, mas essa uma outra
história. Escolher bem o local para o treino é outro fator critico de
sucesso para uma performance melhor. Por que? Primeiro, na maioria das vezes
você estará sozinho e em caso de um acidente, o que fazer, ou até mesmo, um
assalto? Como levar hidratação e os suplementos para suportar você na longa
distancia?
Despertador
toca às 5 horas.
Levanto e caminho direto para a cozinha para fazer a primeira alimentação. Às
6h15' já estava na pista. Tudo estava indo perfeitamente bem, até chegar aos
7k. Nesse momento, uma dor terrível que nunca tinha sentido antes
imobilizou minha perna esquerda. Nem um passo a mais eu estava conseguindo de
tanta dor que estava sentindo. As lagrimas apareceram, eram
incontroláveis, pois estava há 2 semanas da minha maratona e pela
intensidade da dor, sabia que poderia ser sério e que teria problemas pela
frente, pois não havia mais prazo para uma recuperação. Nessa semana
seguinte, alem de muito gelo, anti inflamatório, precisei viajar a trabalho
para Vitoria, ES e Belo Horizonte, MG com dores, prejudicando a minha
recuperação.
Na
sexta, feriado, o Murakami convoca a turma. Lá estava eu, cauteloso, cheio de
duvidas e na expectativa de completar os 10k do treino daquele dia, mas ao
chegar aos 5k a dor reaparece. Insuportável. Percebi o Murakami pela
primeira vez preocupado. Pegou o seu celular e ligou para a Dra. Carolina
Moraes, fisioterapeuta. Na semana seguinte, fiz 3 seções e uma consulta com o
ultra maratonista Dr. Alan Leslie Schlssman, para ter um parecer medico sobre o
assunto, pois com dor ou sem dor, eu estava decidido a fazer a maratona.
Tirado as duvidas, diagnostico feito (estava com o nervo ciático inflamado,
começando na cocha esquerda e se estendendo até abaixo do joelho e região da
panturrilha) medicado, embarcamos para Santiago, Chile.
Em
suma, não consegui fazer o longo de 36k e para ajudar, ganhei uma lesão.
Sábado,
véspera da prova, retiramos o kit e seguimos para o almoço, quando minha
princesa me aborda e pergunta: “ Você está mancando!? Você está mancando!?”.
Até aquele momento não tinha percebido, mas estava com dor e mancando e meu filho com olhar preocupado,
não queria falar que eu não estava preparado para aquela prova, não queria me
desanimar. Confessou isso logo após a maratona.
Chegou o dia. 7 de abril. Largada às 8:30 horas.
... 10, 9, 8,
7, 6, 5, 4, 3,
2, 1 – Inicia-se a prova.
Adotei a seguinte estratégia: Como a dor sempre apareceu
entre o km 5 e 7, decidi administrar a velocidade nesse trecho, assim o corpo
estaria bem aquecido e com sorte, a dor não apareceria. A partir desse ponto,
me concentraria totalmente em buscar a melhor performance.
Cheguei no km 5, nada de dor. Fantástico. Mas no km 7
ela apareceu e, desta vez, estava muito mais forte do que antes. Parei,
sai da pista, procurei um local e fiz um alongamento. Voltei para a pista, mas
não consegui correr, na verdade eu passei a arrastar aquela perna tamanha era a
dor. Pensei, como irei conseguir completar os 35 km faltantes com essa
dor, uma vez que não conheço o meu corpo além dos 30 k ?
O Dr. Alan, havia me receitado um comprimido de Tilenol,
caso a dor viesse. Ao longo da prova, tomei 3. Lembrando que o efeito desse
comprimido é para 6 horas.
Completei os primeiros 10k km com o tempo de 72`, sendo que
faço tranquilamente com 55`. Cheguei aos 20K com 2h40`. Sinceramente, não sei
como consegui. A dor era tanta nesse momento, que eram mais lagrimas do que
suor. Foi quando pensei pela primeira vez em desistir. Uma voz lá no fundo
começou a falar: Pare. Você não tem que provar nada a ninguem. Foi quando, uma
senhora me ultrapassou e atras de sua camisa, estava escrito: “Con Dios,
nada es imposible”.
Gritei comigo: Cadê a sua fé, a sua força? Foco!
Vamos! Invoquei o nome de Jesus por várias vezes e encontrei forças, mas
não sei como foi até chegar aos desejados 36 k. Quando cheguei, no local
onde estava a placa indicativa, havia um corredor desmaiado cercado pela
policia aguardando o resgate chegar. Nesse momento, me dei conta da situação.
Estava muito atrasado, meu filho, sua namorada e minha princesa deveriam estar
preocupados comigo e eu, não podia fazer nada para avisá-los que eu ainda
estava na prova. O que será que estavam pensando? Será que passava pela mente
deles, situações como o que eu acabara de presenciar?
Faltando 1 km para terminar a prova, eu não tinha mais
forças e a dor era tremenda. Se naquele momento eu tivesse mais um tilenol,
o tomaria. Orei a Deus para que me ajudasse a finalizar a prova. Nesse
instante, vejo um jovem correndo em sentido contrario, em minha direção,
gritando “ pai, pai, pai!”. Era o Victor, que não aguentando mais
esperar, venceu a segurança do evento e começou a correr tentando encontrar o
seu pai. Foi um momento muito especial. Ele chorava muito, vendo o seu pai
ali. Suas palavras foram: “ Oi pai! Você é um vencedor! Vamos lá! Não
fala nada. Concentra”. Mais uma vez o meu Deus tinha atendido o meu
clamor. Mandou um anjo me buscar, o meu filho.
De repente, a chegada!
Logo ali na minha frente e correndo em minha direção, gritando e chorando, a
minha princesa que também burlou a segurança e foi ao meu encontro. Atravessamos
de mãos dadas a linha de chegada.
Tempo: 5h 58 minutos.
“Sucesso demora, dói e dá muito trabalho. À direção certa
é mais importante que a velocidade”. William Douglas.
A verdade é que crescemos com as dificuldades e o
estresse por que passamos na vida nos ensinam e revelam coisas que jamais
aprenderíamos se a maré fosse sempre calma e tranquila.
Percival Margato Junior
Maratonista
Nota especial:
Agradecimentos especiais aos corredores Marcos Borges, Marcelo
Assis, João Envagelista e Rogério Resch, pela palavras de animo, às
nutricionistas Marta Rochele, Nathália Possignolo, à fisioterapeuta Carolina
Moraes Righetti, ao Dr. e ultra maratonista Alan Leilie Schlossamn, ao Dr. e
maratonista Luiz Fernando Barone, a Eta Gimenez, personal trainer, ao ultra
maratonista Joison Ferreira, o Jabá, e ao meu treinador, também maratonista
Rodrigo Murakami, as minhas filhas Marcela e Andrea, ao meu filho Victor, ao
Felipe, ao Neto e Ingrid e, à minha princesa Néia, o amor da minha vida, e, por
ultimo, mas o mais importante, ao Espírito Santo de Deus, que me fez
completar não apenas essa prova, mas muitas outras em todas as áreas da minha
vida.
À Vocês, o meu muito obrigado.
Próxima prova? Sim. Ainda esse ano.
Um comentário:
Percival, depoimento emocionante. Seu depoimento só nos dá mais força para continuar correndo. A sensação de correr ao lado do filho deve ser indescritivel....espero que possamos correr juntos....meus sinceros parabens e um grande abraço, Pedro.
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